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COWORKING COMO INSTRUMENTO DE POLÍTICA URBANA

No próximo mês de julho completará 07 anos da entrada em vigor do Plano Diretor Estratégico (PDE/14) da Cidade de São Paulo, Lei nº 16.050, de julho de 2014. Desde sua publicação, o PDE/14 proporcionou mudanças sensíveis no modelo das incorporações imobiliárias e de zoneamento visando, dentre outras coisas, a distribuição de oportunidades através de centros comerciais regionais, fora do centro estendido do município.


Considerado inovador quanto às suas diretrizes sociais e ambientais, o PDE/14 tem seus fundamentos no Estatuto da Cidade e na Lei Orgânica do Município de São Paulo, e suas diretrizes de inovação nas Agendas Urbanas da Organização das Nações Unidas relacionadas à questão da moradia, transporte e desenvolvimento econômico sustentável. Este último, objeto deste texto, é apresentado como instrumento de operacionalização da mudança proposta pela lei em questão.


Nesse sentido, percebe-se pela leitura do referido texto normativo que o município de São Paulo reconhece que, para que mudanças de cunho social e ambiental sejam efetivas, é necessária uma atuação integrada de diversas frentes, incluindo incentivos e estímulos para que os objetivos nele apresentados sejam concretizáveis sem prejuízo do desenvolvimento econômico da cidade e da segurança financeira de seus habitantes, propondo o desenvolvimento econômico através de diretrizes de responsabilidade ambiental e social.


No que tange ao desenvolvimento econômico sustentável, foram previstos objetivos expressos do PDE/14, em seu artigo 176[1], dos quais nos atentaremos no objetivo previsto no inciso V: “potencializar a capacidade criativa, o conhecimento científico e tecnológico e a inovação existentes no Município para gerar atividades econômicas de alto valor agregado e ambientalmente sustentáveis”.


Como é sabido, as atividades tidas como inovadoras, seja através do desenvolvimento tecnológico e científico, ou mesmo criativo, são aquelas que potencialmente desenvolvem produtos e serviços com alto valor agregado.



Grandes centros, como São Paulo, possuem um potencial muito significativo no desenvolvimento destas atividades visto seu perfil de atrair profissionais de todo país e de vários lugares do mundo o que, por si só, já cria um ambiente propício para que estes setores sejam facilmente potencializados através de políticas públicas.


Visando a concretização da pretendida “potencialização”, o PDE/14 previu a criação dos Polos de Economia Criativa e os Parques Tecnológicos. Em suma, ambas as estratégias setoriais partem do pressuposto de que a concentração de profissionais destes setores cria um ambiente de troca de conhecimentos que os beneficiaria mutuamente.


Nesse sentido, os Polos de Economia Criativa consistem em “territórios destinados ao fomento de atividades econômicas relacionadas ao ciclo de criação, produção e distribuição de bens e serviços que utilizam a criatividade”[2] e os Parques Tecnológicos em “territórios de onde há oportunidades para o desenvolvimento urbano baseado no fomento a usos voltados para a produção de conhecimento, desenvolvimento econômico e tecnológico”, visando “concentrar as empresas e instituições voltadas às atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação”, “fomentar o empreendedorismo e incubar empresas inovadoras”, e “incentivar a implantação de empresas que promovam o uso de fontes energéticas alternativas”.


Para viabilizar o desenvolvimento destes projetos, o PDE/14 prevê a possibilidade do município criar incentivos, ou eventualmente, pacotes de incentivos, com benefícios fiscais para contribuintes de ISSQN, isenção de IPTU; isenção de taxas de instalação e funcionamento; simplificação dos procedimentos para instalação e funcionamento; e obtenção das autorizações e alvarás necessários, além de serviços técnico-assistenciais como plataformas de integração dos polos, criação de parques tecnológicos e acesso à linhas de financiamento.


Após a leitura do descrito acima, você deve estar se perguntando: “Caramba, que maravilha! Mas como eu nunca soube disso?” Pois é, de acordo com os próprios relatórios de aplicabilidade da Lei do Plano Diretor, nada relacionado ao objetivo de potencializar atividades de inovação criativa, tecnológica e científica foi, de fato concretizado. Pelo menos, não da maneira que a lei prevê.


Com alguma perseverança, podemos identificar a redução de ISSQN para algumas atividades relacionadas ao desenvolvimento de software e tecnologias da computação, mas nada muito expressivo. Por outro lado, podemos verificar, após a publicação do PDE/14, a criação de alguns projetos municipais muito interessantes.


Temos o projeto TEIA[3] que consiste na criação de coworkings, com perfil determinado por setores da economia, ou não, para que empreendedores sem recursos consigam desenvolver sua ideia e empresa nesses espaços com infraestrutura compartilhada.


Há, também, os FABs LABs, com 12 unidades na cidade de São Paulo, presente no mundo todo, com mais de 1200 laboratórios em mais de 80 países, que consiste em uma rede de laboratórios públicos equipados com instrumentos tecnológicos de alta performance e última geração, para serem compartilhados por cidadãos que apresentem seus projetos científicos, tecnológicos e/ou criativos para que sejam desenvolvidos com a utilização dos Fabs Labs [4].


No mesmo sentido das Fab Labs Livres, a Secretaria da Inovação e Tecnologia da Cidade de São Paulo também desenvolveu os projetos 011.Lab e MobiLab com a criação de espaços de trabalho compartilhados para o desenvolvimento do empreendedorismo de inovação.


O primeiro, conforme a definição da própria Secretaria consiste em “um espaço dentro da Prefeitura para pensar, criar e experimentar inovação no setor público. Busca juntar pessoas de dentro e fora da administração municipal para criar soluções inovadoras para problemas de interesse público, impactando na gestão e melhorando os serviços aos cidadãos”[5]. O segundo também é um espaço compartilhado pela Prefeitura paulistana “para prospectar, experimentar e impulsionar soluções inteligentes para os problemas da cidade”, com foco na ativação e promoção do ecossistema de inovação aberta e pública com dados abertos, mobilizando startups, empresas e organizações inovadoras da sociedade civil[6].



Percebe-se, portanto, que a Prefeitura de São Paulo, encontrou na lógica do desenvolvimento de espaços compartilhados de trabalho o caminho para a tão pretendida potencialização do empreendedorismo e inovação prevista no PDE/14, criando projetos de espaços públicos de trabalho compartilhado. É inquestionável o reconhecimento de que os espaços de trabalho compartilhado são essenciais para o desenvolvimento da cidade.


Ocorre que, ao analisarmos o tratamento dos espaços compartilhados de trabalho da iniciativa privada pela prefeitura, verificamos uma postura bastante contraditória.


Desde o surgimento dos coworkings em São Paulo, intensificada na última década, a prefeitura nada fez para estimular essa atividade mediante a aplicação dos estímulos previstos no PDE/14.


Na realidade, nos anos de 2017[7] e 2018[8], a Câmara Municipal de São Paulo aprovou normas, de iniciativa do executivo, impondo a responsabilidade solidária das empresas que oferecem escritórios compartilhados no recolhimento de ISSQN das empresas que utilizam seu espaço e a responsabilidade de apresentar semestralmente a relação de empresas que utilizam ou utilizaram seu espaço nesse período.


Apesar da norma de 2017 ter sido revogada, ante sua manifesta incompatibilidade com os princípios tributários do Brasil, claramente se constata seu caráter desestimulante quanto a atividade em questão. Tal fato vai de encontro com o objetivo do próprio PDE/14 e revela a falta de compreensão das autoridades municipais sobre o potencial que essa atividade pode ter no desenvolvimento do empreendedorismo e atividades inovadoras.


Conforme bem apresentado por Davidson e Infranca, “Co-working spaces are also often and integral component of the innovation districts – geographic areas specifically designed to create conditions of density anf aglomeration that foste innovation, new business development, and economic growth – that many cities have sought to establish inrecent years”[9].


Em que pese a existência de projeto de lei federal[10] que visa regulamentar a atividade da disponibilização de escritório e demais espaços compartilhados de trabalho, seria interessante o município de São Paulo se adiantar, promovendo a regulamentação da atividade com mecanismos de incentivo e controle, a fim de promover o desenvolvimento e potencialização do empreendedorismo inovador.


Muito além de apenas potencializar o desenvolvimento do empreendedorismo inovador, os escritórios e espaços compartilhados de trabalho, se devidamente incorporados aos objetivos e políticas públicas do PDE/14, podem contribuir de maneira significativa com a descentralização de renda com novos polos econômicos e economia local, bem como na questão da mobilidade urbana, uma vez que viabiliza o expediente fora da sede das empresas em localidade mais próxima à residência dos funcionários e colaboradores.




Gino Paulucci Netto

Sócio Fundador

e-mail: gino@wpmg.adv.br

Tel: +55 11 969 085 402



[1] Art. 176. São objetivos específicos da Política de Desenvolvimento Econômico Sustentável: I - induzir uma distribuição mais equitativa do emprego, desconcentrando as atividades econômicas; II - investir em infraestrutura para minimizar as deseconomias de aglomeração presentes no Município e criar novas áreas aptas para atrair investimentos em atividades econômicas; III - proteger as áreas industriais em funcionamento e estimular sua expansão em moldes compatíveis com as novas condições territoriais do Município; IV - incentivar o comércio e os serviços locais, especialmente os instalados em fachadas ativas, junto às ruas; V - potencializar a capacidade criativa, o conhecimento científico e tecnológico e a inovação existentes no Município para gerar atividades econômicas de alto valor agregado e ambientalmente sustentáveis; VI - promover o desenvolvimento sustentável da zona rural com o apoio à agricultura familiar, em especial a orgânica, e ao turismo sustentável, em especial de base comunitária; VII - promover a infraestrutura necessária ao desenvolvimento sustentável, incluindo obras, empreendimentos e serviços de utilidade pública, na zona urbana e rural; VIII - reforçar a posição da cidade como polo de eventos, ampliando a infraestrutura e os espaços destinados a exposições e congressos; IX - criar as condições para o desenvolvimento do turismo apropriado às características do Município, gerando sinergias entre eventos, negócios, cultura, gastronomia, compras e agroecoturismo para aumentar a permanência do visitante no Município; X - facilitar a instalação de empresas no Município, por meio de incentivos tributários e urbanísticos, facilitando os procedimentos administrativos, em especial nos setores prioritários definidos nesta lei; XI - valorizar a diversidade territorial, cultural, étnica, religiosa e de orientação sexual como um direito que potencializa as oportunidades de desenvolvimento econômico do Município. [2] Plano Diretor Ilustrado. Disponível em: https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2015/01/Plano-Diretor-Estrat%C3%A9gico-Lei-n%C2%BA-16.050-de-31-de-julho-de-2014-Texto-da-lei-ilustrado.pdf, acessado em 15 de maio de 2021. [3] Disponível em http://adesampa.com.br/teia/o-que-e/, acessado m 15 de maio de 2021. [4] “rede de laboratórios de criatividade, aprendizado e inovação acessível a todos interessados em criar, desenvolver e construir projetos. Frutos de uma parceria entre a Prefeitura Municipal de São Paulo e o Instituto de Tecnologia Social – ITS Brasil são abertos e acessíveis a todas as pessoas que tenham interesse em construir projetos coletivos ou pessoais, envolvendo tecnologia de fabricação digital, eletrônica, técnicas tradicionais e práticas artísticas”. VIEIRA, Regiane Balestra. DOS SANTOS, Isabel Cristina. BRESCIANI, Luís Paulo. FAB LABS LIVRES DA CIDADE DE SÃO PAULO: UMA EXPERIÊNCIA SOCIAL INCLUSIVA OU TRANSBORDAMENTO DE CONHECIMENTO TECNOLÓGICO E DA CRIATIVIDADE NA ESCASSEZ DE RECURSOS, REMIPE V. 5 nº1. 2019. P. 124-148. [5] Disponível em https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/inovacao/economia_criativa/index.php?p=246623, acessado em 15 de maio de 2021. [6] Disponível em http://mobilab.prefeitura.sp.gov.br/, acessado em 15 de maio de 2021. [7] Artigo 13: É responsável solidário pelo pagamento do Imposto: IV – o escritório virtual, business center, centro de negócios, escritório inteligente, centro de apoio, escritório terceirizado ou congênere, relativamente às empresas que utilizem seus espaços ou estruturas, quando essas empresas não estiverem regularmente cadastradas no Cadastro de Contribuintes Mobiliários – CCM do Município de São Paulo; LEI Nº 16.757, DE 14 DE NOVEMBRO DE 2017, Disponível em https://leismunicipais.com.br/a/sp/s/sao-paulo/lei-ordinaria/2017/1675/16757/lei-ordinaria-n-16757-2017-institui-o-programa-de-incentivos-fiscais-para-a-zona-sul-introduz-modificacoes-nas-leis-n-13701-de-24-de-dezembro-de-2003-n-14-097-de-8-de-dezembro-de-2005-n-14-910-de-27-de-fevereiro-de-2009-n-15-928-de-19-de-dezembro-de-2013-n-15-948-de-26-de-dezembro-de-2013-n-16-097-de-29-de-dezembro-de-2014-n-16-127-de-12-de-marco-de-2015-n-13-476-de-30-de-dezembro-de-2002-e-n-14-125-de-29-de-dezembro-de-2005-autoriza-o-poder-executivo-a-contratar-operacoes-de-credito-para-financiar-projetos-de-investimentos-institui-o-programa-de-incentivos-aos-eixos-de-desenvolvimento-noroeste-e-fernao-dias-autoriza-o-poder-executivo-a-ceder-direitos-creditorios-das-receitas-de-que-trata-a-lei-n-14-488-de-19-de-julho-de-2007-nas-condicoes-que-especifica-introduz-alteracoes-na-lei-n-14-668-de-14-de-janeiro-de-2008, acessado em 15 de maio de 2021. [8] Artigo 2º: Os escritórios compartilhados (escritórios virtuais, coworkings, business centers, centros de negócios e assemelhados) devem entregar semestralmente à Secretaria Municipal da Fazenda do Município de São Paulo relação das empresas que utilizem ou utilizaram nesse período seus espaços ou estruturas, conforme disciplinado em ato dessa Secretaria. LEI Nº 16.898, DE 23 DE MAIO DE 2018, Disponível em https://leismunicipais.com.br/a1/sp/s/sao-paulo/lei-ordinaria/2018/1690/16898/lei-ordinaria-n-16898-2018-altera-o-art-1-da-lei-n-14166-de-6-de-junho-de-2006-que-regulamenta-o-uso-de-simbolos-oficiais-do-municipio-e-o-art-14-da-lei-n-13476-de-30-de-dezembro-de-2002-que-altera-a-legislacao-do-imposto-sobre-servicos-de-qualquer-natureza-iss?q=16898, acessado em 15 de maio de 2021. [9] Davidson, N. M., & Infranca, J. J. (2015). The sharing economy as an urban phenomenon. Yale Law & Policy Review, 34, 215. P. 235 [10] Disponível em https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=node01mrm8snk1szir1ra9bqs30w6em4691861.node0?codteor=1586947&filename=PL+8300/2017

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